Com uma saudação emocionante às suas raízes e ancestralidade, a escritora Ana Maria Gonçalves iniciou seu discurso de posse na cadeira número 33 da Academia Brasileira de Letras (ABL), na noite desta sexta-feira, no Rio de Janeiro. Autora do aclamado romance histórico Um Defeito de Cor, Ana Maria se tornou a 13ª mulher a ocupar uma cadeira na instituição fundada em 1897 e a primeira mulher negra eleita para o seleto grupo de imortais.
Em um discurso comovente e contundente, a escritora celebrou sua chegada à Casa de Machado de Assis e dedicou o momento à memória daqueles que a precederam. Ana Maria relembrou a trajetória dos ocupantes anteriores da cadeira 33, destacando o fundador Domício da Gama, jornalista, diplomata, contista e cronista, e o renomado linguista Evanildo Bechara, de quem herdou o posto. Sobre Bechara, ressaltou seu legado intelectual e seu profundo amor pela língua portuguesa, mencionando sua vasta produção literária e sua importante participação na elaboração do novo acordo ortográfico.
A escritora também abordou a histórica exclusão feminina na Academia, mencionando a candidatura vetada da escritora Amélia Beviláqua em 1930 e citando as pioneiras que abriram caminho após a mudança do estatuto, como Rachel de Queiroz, Lygia Fagundes Telles, Nélida Piñon e outras. Ana Maria refletiu sobre a presença negra na ABL, lembrando que Domício Proença foi, por muito tempo, o único negro na instituição, e que a negritude de Machado de Assis foi negada por um período ainda maior.
A escritora reconheceu o papel fundamental das candidaturas de Conceição Evaristo e Ailton Krenak no debate sobre diversidade dentro da Academia, afirmando que a discussão em torno da candidatura de Conceição Evaristo, em 2018, contribuiu para que ela estivesse ali hoje. Ana Maria assumiu o compromisso de promover a diversidade na instituição, abrir suas portas ao público e ampliar o empenho na divulgação e promoção da literatura brasileira.
A apresentação da nova imortal foi feita por Lilia Schwarcz, que destacou o impacto de Um Defeito de Cor e fez um paralelo entre o passado e o presente, ao lembrar as recentes operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro. A cerimônia contou com a participação de Ana Maria Machado, que entregou o colar acadêmico, e Gilberto Gil, responsável pelo diploma.
A acadêmica Miriam Leitão destacou o simbolismo da posse de Ana Maria Gonçalves, ressaltando que sua entrada representa uma camada de representatividade fundamental, trazendo a força da mulher e da literatura negra para dentro da Academia. O ator e escritor Lázaro Ramos afirmou que Um Defeito de Cor é “o livro de sua vida” e que a presença da escritora na ABL representa o amadurecimento do país.
Conceição Evaristo definiu a posse como uma conquista coletiva, afirmando que a conquista de Ana representa todas as mulheres negras e escritoras. Gilberto Gil exaltou a qualidade do trabalho da escritora, afirmando que ela é uma das grandes artesãs da palavra e que sua escrita traz uma consciência profunda sobre o que é ser negro no Brasil.
Após a cerimônia, os convidados participaram de um jantar no pátio externo da Academia, com um cardápio inspirado no livro Um Defeito de Cor e criado pela chef Dilma do Nascimento.
Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br

